terça-feira, 26 de agosto de 2014

LIVRE PARA VOAR!


   Estou em estado de graça. É assim que me sinto neste momento. Assisti hoje a palestra do escritor Mia Couto intitulada por ele Desemparedar os Pensamentos, que faz parte do programa Fronteiras do Pensamento, patrocinado pela Softplan, Intelbrás e realização da UDESC, aqui em Florianópolis. 

   Que pessoa linda ele é gente! Como pode alguém com tamanha humildade para aceitar-se como uma pessoa que não sabe e, considerar, ainda bem que não sabe. Combate a arrogância, a prepotência com argumentos tão bem fundamentados que faz a gente se envergonhar perante a aceitação de um sistema vigente sem o questionamento tão necessário. Desestabiliza todo o arcabouço de conhecimentos que a educação clássica insiste em repassar de geração em geração e vai reconstruindo a trajetória verdadeira desde a construção de nossa cultura, indo lá nos primórdios da nossa descendência a partir do homem africano, da cultura egípcia, do monoteísmo, da construção da solidariedade desde o início das comunidades, da dor sentida pelos nossos mortos desde a primitividade e que até hoje perpetuam em nosso senso de sociedade. E vendo nessa reconstrução uma forma de acabar com o nosso medo do outro. O medo exagerado que faz que a pessoa assuma a solidão como padrão de vida, o que é muito triste.

   Na sua fala Mia Couto exemplificou o poeta Ho Chi Minh, um revolucionário e estadista vietnamita, que quando estava preso escreveu versos cheios de ternura. Quando perguntado como conseguiu escrever versos tão lindos dentro daquele lugar, disse que aprendeu a arte de desvalorizar as paredes, elas não existiam. E assim pode criar versos maravilhosos por não aceitar fronteiras. E ele, Mia Couto disse ter assumido tal lema em sua vida: a arte de desvalorizar as paredes e conseguir ser feliz por isso.

   Ele falou tanta coisa tão digna que o lado feminino aflorava em suas falas, a fala do amor, da ternura, da sensibilidade, da intuição, sem deixar de lado o masculino, que se complementam através do raciocínio, do cálculo. ... Que quando pensamos que temos ideias, na verdade são as ideias que tem a gente. Da importância que é estar completamente perdido, assim podemos nos encontrar. Eu sou suspeita de falar (sic) já que adoro sua escrita, pautada no respeito ao ser humano e na luta pelo social.

   E ele tão carinhosamente assinou no livro que levei e para uma leva de pessoas que enfrentava a fila. Muito carismático. Adorei o evento!   

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

SOLTE O LADO CRIANÇA E VIVA!

   

   Hoje eu li um texto da escritora Martha Medeiros intitulado Feliz Aniversário, no Diário Catarinense, pág 18, Donna. Me chamou a atenção quando ela menciona que a gente vai se desfazendo de coisas pelo caminho.

   O texto me trouxe à reflexão sobre esta questão em específico. De como, com a idade, a gente vai deixando de dar importância a determinadas coisas; ou pelo andar da carruagem vamos sendo tragados e a realidade vai se transformando a revelia dos nossos desejos.

   No dia a dia coisas que antes eram importantes com o passar do tempo deixam de pertencer as prioridades. E se vai desfazendo delas, com amadurecimento pessoal ou não, com facilidade ou com dificuldade, o espaço vai se abrindo para que novas experiências surjam.

   Eu falo "coisas" mas também nos desfazemos de... sentimentos, emoções, dores, sorrisos, olhares. 

  Eu me lembrei da música A Noite do Meu Bem que era cantada pela Dolores Duran nos anos 50/60:


"Hoje eu quero a rosa 
mais linda que houver

Quero a primeira estrela que vier
para enfeitar a noite do meu bem

Hoje eu quero a paz de
criança dormindo

Quero o abandono de flores
se abrindo

Para enfeitar a noite
do meu bem

Quero a alegria de um
barco voltando

Quero ternura de mãos
se encontrando

Para enfeitar a noite
do meu bem

Hoje eu quero o amor,
o amor mais profundo

Eu quero toda beleza do
mundo

Para enfeitar a noite
do meu bem

Mas como esse bem 
demorou a chegar

Eu já nem sei se terei
no olhar

Toda ternura que eu quero
lhe dar"

  A música me fez associar que com o envelhecimento a gente se desfaz de algo muito importante: que é a criança que precisa continuar existindo em nós para que atinjamos com leveza a sabedoria de que coisas vão se desfazendo pelo caminho...

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

BRUMAS DO INVERNO

   

   E não é que desapareci pelas esquinas da vida... Eh, andei tão pobre de astral que não tive ânimo de abrir o computer por estes tempos. Mas até que me pareceu saudável tal momento... mais de reflexão, pensamentos e pouca emissão de palavras.

   Andei relendo Roland Barthes, AULA, Cultrix, 1978 e Fragmentos de um Discurso Amoroso, Francisco Alves, 1981. No livro Aula, pág. 85, encontrei uma pérola de Bashô, um haicai lindo:

"Bruma e chuva.
Fuji velado. No entanto eu vou
contente."

   E Leyla Perrone-Moisés diz à pág. 87, AULA: "O que diz o haicai é um momento intensamente vivido por "alguém", mas fixado em linguagem sem o peso do sujeito psico-lógico do Ocidente. Nenhuma moral da história. O haicai é, para Barthes, um lugar feliz em que a linguagem descansa do sentido; e neste momento, segundo ele, é o de que ela necessita. Não como uma fuga, mas como uma tomada de fôlego; não para alienar-se, mas para "dar um tempo" ".  

   A gente procura tanto dar sentido a tudo, que se esgota e o haicai vem a propósito, como Barthes disse "Muda a língua, muda o mundo". E a poesia é transformadora neste aspecto.

   Não vivi só de poemas. Também revi filmes interessantes. Ontem mesmo Antes do Pôr do sol, de 2004, me tomou por completo. Parecia que nem tinha assistido outras vezes. Novas leituras e compreensões... talvez pelo estágio em que me encontro... mais atenta!