domingo, 29 de setembro de 2013

IMAGENS DE EMBASBACAR

  
   Finalmente está caindo uma chuvinha boa para os nossos lados, quase três meses sem um pingo, haja fôlego para respirar com umidade a 30%. Até me alegrei com o sotaque que a batida da chuva está fazendo, música para os ouvidos.

   Ontem me entusiasmei ao assistir o filme Deus é Brasileiro de Cacá Diegues, 2003, baseado num conto do João Ubaldo Ribeiro, O Santo que não acreditava em Deus. Deliciosas as paisagens do Jalapão - retornei ao local  através do filme, lindas falésias, dunas luminosas, cachoeira da Velha em sua beleza espumante. Lindas imagens do local, de dar água na boca.

   Também senti isso hoje ao ver As Aventuras de Pi. Paisagens e fotografias de embasbacar, verdadeiras pinturas da natureza em exibição durante toda a filmagem. Como pode haver imagens tão maravilhosamente expostas e trazidas a nós pela captação de uma câmera. Fiquei completamente enamorada diante da tela. Vi o céu e o mar de Van Gogh em seus tons de cinza diversos... O pôr do sol em seu brilho fulgurante em diversos matizes... Eu poderia ficar por muito tempo hipnotizada, descrevendo as belas imagens, que mereceriam um oscar (não sei se ganhou neste quesito). 

   O filme também me surpreendeu através da história do adolescente e das constatações de que os ensinamentos são de grande valia nos momentos de crise, momentos em que a vida e a morte estão na berlinda, e a coragem e o arriscar-se são determinantes para a sobrevivência. E ainda as belas descrições dos diversos deuses, de como a fé revigora as forças e dá energia para as diversas surpresas que o destino nos apronta.

   Fico agora com o aconchego da chuva fina que cai no telhado e que está propício a leitura de um bom livro. É o que pretendo agora! Boa semana!

APRENDIZ DO VIVER

   

   Ufa! Nesta semana eu corri muito... deu uma moleza geral pela necessidade de dar conta do recado. Mas hoje, hoje está sendo só alegria por ter tempo para fazer o que mais estou gostando: tocar violão... e já estou conseguindo ir ora bem, ora malzíssimo (neologismo que inventei, graças a Saramandaia); escrever; ler. São assim as aprendizagens, não é? Eu quero sempre estar neste lugar como uma aprendiz, disso não abro mão!

   Até me lembrei do que li do Fernando Sabino, 1998: 


"Hemingway (escritor americano , autor de O Velho e o Mar, Prêmio Nobel de Literatura) se suicidou. No seu necrológio a revista Time escreveu: "Vivia olhando tudo como se fosse a última vez". Estava sempre se despedindo — um suicida em potencial. Resolvi fazer exatamente o contrário: estou sempre chegando. Não aceitei a imposição de um caminho que não era meu, e procuro olhar tudo como se fosse a primeira vez". 

   Penso que a gente deve aproveitar a oportunidade para verdadeiramente enxergar a largos olhos, com a essência da alma e satisfazer o espírito. Como o Fernando Sabino, eu até hoje não paro de sonhar e me permitir a isso — nada de ficar com o pensamento no comodismo, no jeito sempre comum de ser... Extrapolar, pois a idade me permite sempre buscar o riso, a alegria. E já ouvi dizer que alegria é felicidade! Mas calma aí... sempre buscando não magoar o outro que não é culpado pelas minhas insatisfações e riscos.

   Outro escritor que estou lendo e me apaixonei pela escrita foi do Ronald Claver - na novela Lua Cheia de Sol, RHJ, 2004:

"É preciso ler. Ler o mundo, ler as esquinas. Ler as pessoas. É preciso ler os pobres e com eles aprender um pouco da humildade, tolerância e sabedoria. Ler os jornais, revistas, esquinas e bares. É preciso ler os poetas e aprender com eles um pouco de rebeldia e ternura. É preciso ler as mulheres e conhecer um pouco das artimanhas do mundo. É preciso ler os lábios e decifrar palavras que possam modificar nossas vidas. É preciso ler o cotidiano para tirarmos lições para o futuro. É preciso ler a letra que demarca as margens do coração e aponta para os horizontes impossíveis, improváveis, mas encantadores e mágicos. É preciso ler...


   É assim, como aprendiz, estou sempre chegando e buscando ler... querendo ver, experimentar, rir, gostar de viver para mim é isso!

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

MÁSCARA HUMANA

   

Não sei que revertério me deu, ou aconteceu... Só hoje consegui me sentar à escrivaninha e ter um tempinho para escrever. Bem, a verdade verdadeira mesmo é que também aquele espírito alado chamado inspiração fez a graça de desaparecer justo quando eu estava assoberbada com visita em casa. Pode ser isso, a gente tem que estar disponível para ciceronear, principalmente quando é alguém especial, e um novo amigo argentino mereceu o meu tempo e de minha família.

   Agora não tenho mais desculpas, vamos às novidades. Consegui por em dia a leitura de três livros, conseguindo cumprir meu projeto de leitura de pelo menos um livro a cada quinzena. Assisti também a bons filmes, revi outros tantos, fui assistir a Hannah Arendt, a famosa filosofa alemã de origem judaica. Adorei o filme e pelo conteúdo o diretor conseguiu nos mostrar que aquela mulher é um diferencial.

   Uma inteligência instigadora, perspicaz, crítica, voraz em buscar respostas às questões quanto ao sentimento do medo, do mal, da mediocridade humana na análise do julgamento de um nazista; tentando entender erros cometidos pelo ser humano ao aceitar cumprir ordens sem o necessário questionamento, apenas agindo como fantoche, um ninguém. A filósofa e escritora coloca em prática a capacidade de pensar e deixa claro que nós, na sua maioria, não  pratica. Por isso está longe de ver... de realmente conhecer em profundidade as muitas ideias e atos e fatos... e se vê solapada à mediocridade.

   O filme dá uma pincelada em sua vida pessoal, profissional e como escritora. Um espírito crítico que não arreda pé de sua verdade. Admirável a coragem no enfrentamento da verdade que considera ética. Vale conferir!

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

EU REVIVI COM A PALAVRA!

   

   Esta semana eu vi um capítulo de Saramandaia, mini série da Globo, e adorei uma palavra dita pelo professor: DESVIVER. Eu gostei tanto da palavra que me soou mais doce do que morrer. E também quando a Dona Redonda diz que está fazendo bodas de pratismo. É incrível o poder da palavra, como ela nos toma, nos envolve, nos faz caminhar por outros rumos que não os que a realidade daquele momento comporta. Voamos aos sons, rearranjos das palavras, dá para poetizar a vida em palavras, sair da aridez, da crueza de uma realidade nem sempre tão poética assim, mas as palavras, há!... Elas nos dão a chance de ter esperança a partir da poesia.

   Como disse uma escritora é só você olhar que passará a ver. Eu estou crendo que ela tem razão no que diz, pois vira e mexe eu vou me surpreendendo com o uso interessante de uma palavra.

   Outra coisa que me aconteceu hoje ao ouvir a conversa de dois mendigos e um deles disse: “Não tem a ver. Para que servem os amigos”... Eu estava passando pela rua e essa preciosa frase saiu da boca de um morador de rua, ou mendigo ou um pedinte que naquele momento estava falando com o outro sujeito.

   Eu passei por eles e continuei intrigada com a beleza da frase (acho que o ouvido está mais atento ao que se passa ao redor). Tão comum, mas que trouxe impressa na fala a questão do humano. Quando se pensa que a humanidade está perdida, que as pessoas vivem egoícamente só pensando e olhando o próprio umbigo, não tem como não ficar surpreendida. Isso, foi isso que aconteceu comigo, de onde menos se podia esperar saiu esta frase regada à esperança. De uma pessoa que vive na falta constante de tudo, sem um elo com a realidade social... um momento de lucidez em que a palavra abarcou a dimensão do que ali estava inscrito.

   Aquela frase me soou como um hino a inspirar que ainda existe possibilidade salutar nos seres humanos. Ou será que me engano???

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

OLHAR E GOSTAR!

   

   Hoje a tarde comecei a assistir um filme enquanto almoçava. E eis que me deparo com o também apaixonante Richard Gere, com sua cabeleira já totalmente branca (provavelmente o personagem o pedia). Ele, tal qual o Morgan Freemam, parece estar aceitando os vincos que vão aparecendo com o envelhecimento. As rugas já se fazem presentes, e com o efeito da maquiagem parecem bem discretas, mas o danado continua lindo, né!

   Bom, tem dias que me olho no espelho e gosto de mim, gosto do que vejo, me tranquilizo com a figura da mulher que parece me sorrir. Um sorriso que quer me dizer para eu não ficar assustada; que é tudo verdade, que você está à beira dos sessenta.

   A imagem me parece bem real, com os vincos próprios da idade (apesar do esforço diário de cremes anti-rugas, que no fundo apenas são paliativos para minorar as perdas diárias do viço). As rugas que vejo hoje não estão tão marcadas, parecem suaves, nada exagerado nos traços que aparecem durante o breve sorriso.

   Não é o caso de outros dias, quando me pego observando a figura no espelho e vendo como está envelhecida, com um ar apagado, desenergizada, sem cor e realce. Os traços carregados e marcados, a figura estática e sem expressão. Nada de sorrisos, apenas a constatação de que ando me parecendo com a minha mãe da velhice.

   Por que será que a minha mãe na sua velhice me transmite esse perfil? Provavelmente reflexo de sua história de vida, onde no final vai sendo marcada pela dor que sempre se apresenta a todos os mortais. O brilho do olhar apagado e olha para a frente como quem necessita cumprir a jornada obrigatória sem grandes alardes. A energia torna-se fugidia, e, às vezes, necessita de forças desconhecidas para parecer normal, fazer as obrigações, dar conta do recado nas metas que lhe são cobradas. Heroicamente se levanta, enfrenta o batente, na presença de todos os seus medos e suas lembranças que acoçam-lhe incessantemente, saudades de algo que não existe mais.

   Deixa eu voltar e aterrizar. Devo estar mais leve e tranquila hoje e em outros dias me achar medonha. Deixo constatado que não é do mesmo jeito sempre. Têm dias que é ótimo, têm dias que é muito bom e têm dias bastante destemperados também, como acontece com todo mundo.

   Gosto mesmo é quando me olho e me gosto! 

   Por sinal me lembrei de passagens do livro que ando lendo Palavra por Palavra, onde a escritora Anne Lamott nos dá instruções sobre escrever e viver, escrito em 1994, mas a edição é de 2011, da Sextante, na Língua Portuguesa:


"Acho que é assim que deveríamos viver no mundo - presentes e perplexos... Qualquer pessoa que desejar pode ser surpreendida pela beleza ou pela dor do mundo natural, da mente e do coração dos homens, e pode tentar capturar simplesmente isto: os detalhes, as nuances, a essência. Se começar a olhar a sua volta , passará a ver." pág 106/107

" Às vezes fico com pena de mim mesmo. Enquanto isso, estou sendo carregado por grandes ventos céu afora."  Citando palavras ditas por um sioux (índio americano)pág 129

"Acordo. Ando. Caio. Enquanto isso, continuo dançando." Citando Hillel, pág 131

   Deve ser isso, tanto minha mãe, quanto eu, ou quem quer que seja, deve estar sendo carregado por grandes ventos céu afora e é preciso prestar atenção na vida e dançar!  

domingo, 1 de setembro de 2013

BISBILHOTANDO OS PORÕES DA INFÂNCIA

   
Olha eu fazendo o mesmo que na barroca dos tempos de criança!

   Ruy Castro, no seu texto "A alta cultura invadiu o seu passado", págs 36-37 da Revista Florense, 2012 (acho! esqueci de anotar), está revisitando o seu passado, nos idos de 1966, na literatura que naquele tempo era considerada com pouco caso: Mandrake, Tarzan, Almanaque do Pernalonga, dentre outros, hoje relíquias com preços expressivos.

   Aí me deu uma vontade de bisbilhotar as empoeiradas prateleiras de minha memória: o que eu estaria fazendo em 66?...

   Estou aqui a fazer as contas, eu estou com 10 anos então. Já cursando o quarto ano primário. Nesta época eu, uma aluna medrosa, tímida, que se sentava na última cadeira da sala. Lembro-me da minha professora, Dª Natália, Grupo Sandoval de Azevedo, que agradeço a paciência e a compreensão das minhas limitações, ela me ajudou a vencer etapas da Geografia, que me pareciam intransponíveis na hora da avaliação, onde o conhecimento se perdia.

   Também me lembro de um grupo de meninas que um dia disseram que iam me pegar na saída da escola. Eu muito apavorada, saí correndo e fui me esconder num lote vago e cheio de mato bem ao lado da escola. Fiquei por lá até certo tempo que considerei seguro e o outro dia transcorreu normal, sem sobressaltos.

   Quanto às leituras de revistas em quadrinhos, adorei ler o artigo do Ruy Castro, pois me lembrei da infância, com todas aquelas revistas mencionadas por ele. Eu era fã do Mandrake, achava-o elegante em seu traje de mágico; do Fantasma com seu uniforme de herói. Na nossa casa os livros eram escassos devido a falta de dinheiro, mas revistas em quadrinho eram acessíveis aos trocados ganhos dos padrinhos. Minha mãe se esforçava, apesar da pouca condição, fez questão de adquirir a coleção BARSA, que continha todas as áreas do conhecimento.

   Também veio claro que em época das férias de meio do ano, a professora de Português (antiga Língua Pátria) passava tarefas para as férias: todo dia tinha que fazer uma redação contando como foi o dia... isso durante os trinta dias de férias... Eu detestava a obrigação, mas hoje vejo que foi muito salutar a produção desses textos, o que abria caminho para a imaginação. 

   Das travessuras também me lembrei da "barroca", que era como chamávamos um buraco fundo (penso que mais ou menos uns 15 a 20 metros de fundura que existia em um lote na Rua Professor Raimundo Nonato (hoje tem um prédio), no Bairro Santa Tereza, onde os construtores jogavam terra, restos de construção. Lá era muito perigoso, pois se achava também cacos de vidro. Mas a criançada nada se importava e pulávamos lá de cima num salto único até embaixo, apostando quem pulava mais longe... Tempo bom de travessuras e sem maldades!

   E foi numa dessas brincadeiras lá na barroca que meu irmão recebeu uma pedrada de bodoque bem na testa. Chegou em casa todo ensanguentado e, minha mãe, com o susto, acabou desmaiando. Recuperada, levou-o ao Pronto Socorro onde recebeu mais de nove pontos. Que susto levamos nesse dia e nunca descobrimos o autor da trapalhada.

   Agradeço ao Ruy Castro por ter me ajudado a juntar os cacos que estavam soltos nos porões do esquecimento. O que você estava fazendo nesta época? Anime-se e recorde os bons tempos!