quarta-feira, 30 de março de 2016

SIMPLES ASSIM A FELICIDADE

   

   Voltando ao assunto Miopia, da postagem anterior. Por que ela não fez a cirurgia, tão comum nos dias de hoje, por quê? Pergunta que com certeza deve ter sido feita em sua cabeça, é você que leu, não foi? Pensei em fazer mesmo, mas quando o oculista (acho oftalmologista tão feio) me informou que eu iria enxergar bem de longe, mas começaria a ter de usar óculos pra perto, pois a vantagem dos míopes é não ter a vista cansada rápido. Desisti. Uai, você provavelmente dirá (claro, se for mineiro, das Minas Gerais), e lhe dou a resposta:

   AMO ler, amo demais, e por isso naquele momento decidi que o maior valor pra mim era ler sem problema... Agora chegando os sessenta o problema vem de mansinho, aceitar né, e quem sabe repensar a operação.

   Desse gancho é que resolvi destrinchar esta postagem, pois assisti fim de semana o filme Hector e a Procura da Felicidade, de 2014, filme germano canadense britânico e tem uma atriz que gosto bem, Toni Collette, na verdade fez apenas uma ponta. A película, eu achei, tem uma ligada cômica mas sem o exagero.

   O tal Hector é um psiquiatra bem interessante, estilo obsessivo, tudo no controle, nos mínimos detalhes e tem uma namorada que contribui para deixar tudo, tudinho como ele gosta, apaixonada que é por ele daquele jeito. O problema é que o personagem sente que lhe falta algo, não está satisfeito consigo e se autorrecrimina disso interferir na relação psiquiatra - paciente.

   Decide então que precisa sair em busca de questões sobre o que é a felicidade, o que representa para as pessoas com quem ele tem algum tipo de convivência e adota um diário onde vai escrevendo o que pensa ser pelos diversos lugares por onde viaja. Muito legal as experiências que ele segue adquirindo e em consequência ficando cada vez mais confuso, porque o leque de possibilidades vai se ampliando ao invés de uma resposta única.

   Vale a pena assistir, dicas legais que estão sempre a povoar as nossas mentes quando o assunto é felicidade. Palavrinha complexa, de significados diferenciados para cada um. A lição mais importante do filme foi mesmo reconhecer que às vezes não se está pronto para ela, a tal felicidade, por que motivo seja, imaturidade, não ter um terceiro olho, sensibilidade, poderia listar infinitos conceitos que nem a cobra da mitologia que come a própria cauda.

   E o personagem, o Hector, finalmente percebe que sempre esteve ao lado da felicidade, mas teve que se abrir para o mundo para então reconhecê-la. Voilá! E seguindo a orientação sábia do guru que encontrou em uma de suas andanças, de que a gente tem a obrigação de ser feliz. Muito gostoso o filme.

   Ler é uma das coisas que me deixa bem feliz. Eu preciso de pouco, do simples!    

quarta-feira, 23 de março de 2016

VANTAGEM DE SER MÍOPE

   
Foto de celular míope como eu! rsrsrs

   Uma brecha no meio da tarde me permitiu ver o mar. Banho de mar, caminhada, banho de mar, caminhada, banho de mar. Eu pensei que domingo seria o último dia que iria a praia antes do frio chegar, fui e a água já expectava o que vem, mais fria... mas não é que hoje o dia esteve ensolarado, o mar, uma piscina natural e quentinha, sem onda, nem vento, e eu pensei estar em outro país: Argentina, Uruguai... Pra onde eu caminhava todos a falar espanhol. Eu me senti órfã, a única brasileira nas praias florianopolitanas. Nuestros vecinos lotam na temporada e até agora ainda chegam.

   Olhei para as belas pequenas montanhas ao fundo, a extensão daquele marzão, o céu azul, poucas nuvens e olhando, olhando pra valer, como se não pudesse perder a oportunidade, como se fosse o último dia de vida. E claro, minha visão embaçada, lusco fusco. Sabe como é a vida de um míope né, pois é, sem óculos no mar fica difícil enxergar claramente as pessoas e a paisagem a distância, toda a minha leitura é opaca.

   Me fez lembrar o Documentário Janelas da alma, de 2001, brasileiro, onde os cineastas gravaram pessoas com deficiências visuais incluindo míopes. Estão no rol, José Saramago, Hermeto Pascoal, Oliver Sacks etc. Como é a visão de mundo para tais pessoas através dos próprios relatos. É muito interessante a experiência fenomênica. E além do que, a depender da extensão da deficiência, o sujeito vê acrescentado à paisagem, brilhos, ondas, espectros, nebulosidades, alternância de cores que vão se esmaecendo ou intensificando. Muito legal mesmo os relatos. Vale a pena assistir, disponível na rede. Inclusive alguns dos entrevistados nem estão mais entre nós e é bom revê-los.

   Pois eu estava na opacidade dentro da água e não estava mergulhando. Enxergando o mundo à minha maneira. Lembrei-me desde os vinte e poucos anos vir com essa inusitada experiência de a certa distância deformar as pessoas. Quando alguém conhecido acenava com movimentos de braço e um tchau de longe pra mim, eu correspondia ao aceno, mas não saberia dizer quem era se estivesse sem óculos. Recorria a alguma colega próxima perguntando se conhecia e ela meio assustada dizia é fulano, sicrano, e eu ah! Estratégia que administrava, pois detestava óculos e ainda podia me dar ao luxo de usá-lo somente durante as aulas.

   Diferente agora que estou na beira dos sessenta, pois que a partir dos quarenta a pessoa começa a perder um por cento da visão a cada ano. Cada vez vou sentindo as diferenciações, o míope demora a ter problemas de vista cansada, mas nem tal benefício continuo a usufruir, passando a usar óculos bifocais e a ter como companhia as tradicionais moscas volantes, imagens em formato de círculos, pontos, riscos, nuvens, teias etc.

   Vejo o mundo distorcido e olha que não é por causa da confusão política!   

terça-feira, 15 de março de 2016

MÁSCARA HUMANA II

   

   Vi o filme Dois Dias, Uma Noite, belga de 2014. Foi indicado a Palma de Ouro no Festival de Cannes e a atriz tem o prêmio de melhor atriz do cinema europeu, Marion Cotillard.

   A história em si aparenta simples, é uma via crucis todo o tempo e no ínterim vai abocanhando problemas complexos em relação ao estar no mundo e o outro.

   A personagem principal é uma trabalhadora, mas que estava ausente por problemas de depressão. Nisso, quando do retorno, o chefe coloca aos colegas uma escolha, a demissão dela ou a perda do abono. Ela ficando, ele não tem como pagar a eles, perda de mil euros a cada um.

   A votação feita pelos funcionários (16), a esmagadora maioria concordou com a demissão, menos dois . Uma das colegas que votou contra isso, procura ela e diz que o chefe aceita fazer nova votação na segunda feira, uma vez que vários colegas foram intimidados por um deles. A proposta é que ela tem o fim de semana a fazê-los mudar de ideia.

   Começa a ladainha, a via crucis a casa de cada um dos colegas de trabalho visando conseguir que eles votem a seu favor e não perca o emprego. Cada lance, cada visita faz bombar dentro da gente o sentimento de dor quanto a mesquinhez que carrega o ser humano.

   Além do que, a depressão, apesar de dissipada a crise que levou ao licenciamento, marca o pertencimento a ela; processo complexo, a doença é minimizada com uso de remédios e tratamento, mas subjaz ali em forma latente. Como fazer que isso não a imobilize é o "xis" da questão. O interessante nessa rota é que os vários momentos em que ela pensa, ou fala em desistir e ficar dormindo, é amparada, respeitada e convencida a ir em frente pelo marido, figura que aparece como peça fundamental para que ela suplante o desânimo e siga.

   Assim passa o fim de semana, de casa em casa, ouvindo claramente colegas colocarem o dinheiro acima de tudo, pouco ligando como isso repercute na vida dela; é vista como descartável, objeto e não sujeito.

   Também surpreende como as pessoas se deixam sugestionar por intimidação e, no caso, votaram contra ela. A fragilidade de caráter, a imaturidade, o egoísmo, mosaicos que vão sendo conhecidos e permeando cada visita. Alguns mostram-se envergonhados da atitude e aceitam ficar do lado dela.

   Ela mendiga, pedinte a cada um dos colegas de trabalho. Um deles diz que vota nela, mas tem medo de não ter o contrato renovado. Outra colega é intimidada pelo marido a não mudar o voto. Ela vai pra casa desanimada e se entope de remédios, toma todos de uma só vez e foi parar no hospital. A colega assume votar a favor dela, com isso encerra o casamento insuportável, mas não pode voltar pra casa, ficando hóspede dela. 

   Na segunda feira, após a votação ficar em oito a oito, ela junta seus utensílios, mas o chefe a chama para reunião, diz que não será demitida e que todos vão receber o abono, apenas um contrato não será renovado. Ela não aceita ficar e prejudicar uma outra pessoa.

   Termina a sessão com ela caminhando revigorada, a energia gasta e a vivência de cada situação restaurou sua autoestima. Fala ao marido pelo celular e diz que não conseguiu o número de votos e que já vai em busca de novo emprego.

   É só aparecer a crise que as máscaras caem.   

segunda-feira, 14 de março de 2016

A TAL DA PATUSCADA

   
Olha eu aí, de costas, bermuda bege, aproveitando...

    Domingo à flor da pele... 

   Na verdade somos golpeados todos os dias, com o lenga-lenga de falsos políticos (senadores, deputados, ...) desde a nossa proclamação... corrupção sistêmica, diz bem claro o filme Tropa de Elite 1 e 2, e dificilmente, nós, pobres mortais teremos força a bancar o poder do capital, do econômico, de elites preocupadas em ter que dividir o bolo (e estão muito preocupadas). Somos apenas as formiguinhas, que caminham devagar "...com passos de formiga e sem vontade...", como bem o diz o cantor Lulu Santos. Veja bem, eu disse Lulu... (afinal ninguém quer nada de revolução) e...

   E não vale a pena falar de politicagem a altura do jogo... Vou mudar o disco, afinal o lance aqui é outro. 

   Que tal falar de "patuscada"... pois é, descobri a pouco o significado da palavra, após ter lido o conto do insuperável escritor brasileiro Machado de Assis, Pai contra mãe, conto antigo dos anos 1900. E lá está ostentosa a palavra. Como assim, pensei eu, Patuscada que conheço é o restaurante localizado lá na Bernardo Monteiro com Afonso Pena, em Beagá, por sinal com deliciosas iguarias. E sempre que o bolso dava condições gostava de ir. Nunca imaginei, ou sequer fiquei tentada a buscar o significado, até ler o tal conto do nosso aclamado Machado.

   E saber que também tenho umas asinhas para a tal patuscada e qual brasileiro não tem, me diga, povo alegre, que ama o encontro, que tudo é motivo de ... Com certeza Reich deve estar revirando no túmulo ao me ver confessando tal heresia. Ele que no livro Escuta Zé Ninguém expôs de forma veemente o papel do filósofo, do homem intelectual na vida social, no sentido de lutar por nós, pobres "Zés" ninguém. Desculpa Reich, desculpa de verdade. Ficou sem entender?

   Explico: no livro o autor conversa com o simples homem do povo falando porque ele não participa de "patuscadas (grifo meu)". O livro é uma obra belíssima que coroa a reflexão e o pensar político, filosófico, social. Pra mim serviu como uma bíblia no sentido de questionar o lugar no mundo, o papel necessário a todo cidadão - deixar de ser alienado. Está disponível na rede, vale a pena conferir, um clássico.

   Nada de coxinha, por favor! Nem aceito patuscada com o meu voto!   
   

sábado, 5 de março de 2016

QUERER GRITAR!

   

   Agora estou dando para recitar poemas em voz alta, quem sabe assim imiscui em mim labaredas de inspiração, quem sabe eu remoce mais e mais e mais; quem o poderá admitir se eu mesmo ando tonta, querendo explicações por momentos de total impossibilidade de criação.

   Mesmo na minha simples e possível poesia, ando feito um dândi perdido, elucubrado em si mesmo e que não acha veias voláteis para a iniciação decolar. Ando desfalcada de "insights". Tanto que presumo  ter encontrado o livro certo para reverberar a minha necessidade de gritar ao mundo a minha insatisfação.

   Estou relendo os poemas de Charles BAUDELAIRE, As Flores do Mal. Tradução de Ivan Junqueira, em edição bilíngue, adquiri o livro em 2006 e somente agora encontro o trânsito interno propenso a entender os dizeres do famoso poeta francês, precursor do poema moderno. Então, dez anos depois, Baudelaire sai do armário e seu povoado de tempo, inferno, morte, vem encantando o meu jardim com suas rajadas de simbólico, de realista, e até mesmo de surrealismo.

   Não bastasse, adotei um companheiro a ele, sonetos de Gregório de Matos, na obra Lyrica, editada em 12 de novembro de 1923, que teimava ficar ancorada na mesinha onde estão as obras a serem lidas. Iniciada também a tempos atrás, dei com um marcador numa de suas páginas ao fazer pesquisa no livro após um poema enviado pelo professor de literatura. Pois, então, o poeta barroco, alcunhado de "Boca do Inferno" com sua satírica pregação. Um poeta brasileiro, baiano, do século XVII, destoando de Baudelaire, do século XIX, francês, vamos ver onde chegar. Ambos autênticos em sua poesia, sem se preocupar com a censura do ambiente social em que viviam.

   Ando gostando de exercitar a voz alta, tantos silêncios andam contaminando minha existência, atípica a tais comportamentos. Voilá! 

terça-feira, 1 de março de 2016

FOGO DA VIDA

 
    No fim de semana assisti o filme Vidas que se cruzam, de 2008, e somente ao final descobri que a atriz que eu estava achando muito bonita, estilosa no porte era nada mais nada menos que Kim Basinger, de quem sou fã desde jovem. Antigamente se faziam posteres enormes dos astros e eu tinha um dela, poderosa.

  A maturidade realçou ainda mais a sua beleza e nesta película, a personagem da atriz traz um ar de insatisfação existencial, uma carência que não consegue ser suprida pela família, marido e filhos.

   Começa a ter um caso com um homem, não está claro como se deu o encontro, mas o lastro da paixão vem forte e ambos sedentos por momentos de calor e proximidade de corpos. Isso só até onde ela o permite, já que não dá conta de tirar a camisa. Apenas abaixo da cintura é permitido ser visualizado pelo parceiro.

   Fiquei sem entender porque se dava tal atração entre os dois, já que tinham família constituída e estável, era o que parecia, até que em algum momento chega a hora dela encarar a realidade e mostrar sua cicatriz - que se encontra na secção de um dos seios - consegue desabotoar a camisa; se surpreende pois, o parceiro do desejo ainda continuava a tê-lo, demonstrando com um beijo seguro na área do corte. Ela deseja operar para ter o seio de volta, mas o parceiro, autêntico, diz que bobagem, o importante é que derrotou a morte. Ufa, que linda lição!

   Mas não é bem assim que acontecia quando a relação era tentada pelo marido, que não dava conta de encarar as mudanças que a operação do câncer de mama provocou. A esposa deixou de ser desejada, e a morte da relação escancarada.

   Pior, a filha mais velha começa a desconfiar de seus constantes desaparecimentos e desculpas de atraso. Seguindo a mãe descobre onde fica o ninho de amor. É difícil aceitar que a mãe tem outra vida. E age, por ciúme, ou impulsividade, querendo assustar os dois apaixonados, acabando por provocar um incêndio no local em que os dois se amavam.

   Esses lances no filme não vem seguidos, coerentes, não! Vão e voltam em partes, ora mostrando o passado, ora o presente. A reviravolta na vida da filha mais velha, que quando da morte da mãe conhece um dos filhos do amante, o qual quer entender o porquê do pai ter um relacionamento fora do casamento. Ela nunca relata a ninguém o acontecido. Se apaixonam, mas a fatalidade está marcada nela e a insegurança e vida errônea são os caminhos que trilha. Ela abandonou a filha após dois dias de nascida. E hoje, com o trágico acidente do rapaz, pai de sua filha já com 11 anos, este pede socorro ao amigo para descobrir o paradeiro da moça que o deixou .

   Era de se esperar que o encontro entre mãe e filha fosse marcado pela emoção e alegria. O medo dá o realce aquela mulher, e o desespero de não saber como reagir a nova realidade, assumir o papel de mãe que a amedronta, encarar a culpa (entra no quarto para visitar o ex-marido e consegue falar sobre o que aconteceu no dia trágico. Ele está em coma, mas ao falar disso consegue expulsar os demônios que carrega ... dedução minha, óbvio), o retorno do passado bate forte no presente e exige que a fuga tenha fim. A filha é doce e estruturada, tem paciência com aquela mulher amargurada pelo destino. Finalmente o pai deixa o estado de risco e ambas, mãe e filha vão ao seu encontro.

   Durante a fita, eu ficava pensando em como não adianta fugir. Pra onde for, o peso da cruz a ser carregado. E o peso só é extraído, diminuído, quando expulso para fora. Ferida que há muito tempo vinha sendo cultivada internamente, sem cicatrização... marcando os caminhos com angústia extrema e bloqueando escolhas.

   E aquela mulher, marcada para sempre com o corte do seio, que não consegue o amparo e afeto necessários no momento crucial de vida? Como o desejo, o amor, se esvaem frente as dificuldades com relação a saúde? Por que os homens têm tanta dificuldade em assumir as responsabilidades de Homem? Será não amadurecem nunca?

   É apenas uma imitação da vida, um filme, mas como exemplifica tantas realidades que se ouve falar. Porque será que para eles (os homens, claro, generalizando) a fuga funciona como escape para o descomprometimento com o outro? E não fica o remorso. Por quê?