sábado, 31 de março de 2018

MURMÚRIOS D'ÁGUA

   Recentemente assisti o filme A FORMA DA ÁGUA, do diretor mexicano Guillermo Del Toro, premiado com quatro estatuetas no Oscar.

   Senti que Woody Allen invadia a tela. O pensamento romântico levando ao fantástico. E a partir daí a paixão entre mulher e homem dando conotação do maravilhoso amor. Por mais que teimem dizer ser o romantismo burguês, a gente não cansa de ver na tela. 

   Provável que o autor respeite e admire Woody Allen, porque vi uma releitura de Allen. 

   A moça não fala e faz uso dos sinais na comunicação. É uma das responsáveis na limpeza de laboratório científico, onde se guarda segredos de Estado. A mocinha tem vida solitária, nenhum amor, dois amigos: o vizinho, que compartilha viagem imaginativa e a colega de trabalho, com quem pode contar. Fora isso, do trabalho para casa, da casa para o trabalho.

   Quando, então, entra em contato com o ser fantástico que necessita estar dentro da água salgada para sobreviver. E aos poucos, se aproximando, tornando-se parecidos, e a não presença da palavra em som, os possibilita ir além na linguagem.

   Os murmúrios do amor presentes na dança, no encontro de dois seres puristas, no mundo de água que transborda no pequeno espaço do banheiro. Dá para acreditar nos deuses, tão linda a cena. 

   Aventura vai além, veja com próprios olhos. Amei demais!

MORDAZ CURIOSIDADE

   Estou lendo dois livros que estão me deixando excitada. Como a gente é curiosa com a vida alheia, eu querendo descobrir, através das palavras, a experiência pessoal e como se safaram das dificuldades. Ambos trazem os segredos do cotidiano. Sentimento e emoção a flor da pele. Também um sem fim de perguntas que a gente se vê questionando ainda hoje. A existência é deveras diferente de ser para ser e ao mesmo tempo, parecida.

   O primeiro livro, da filósofa Lou Andreas Salomé, Minha Vida. A escritora, por sinal, retratada em filme recente, LOU. Mulher que marcou Nietzsche, Rainer Maria Rilke e Freud. Publicado em 1951, trata-se de "um retrato literário de uma vida que obedecia às suas pulsões mais profundas." 

   E aqui está a ânsia de caminhar cada página, sentindo a mulher. Ela inicia assim: 


"A vida humana — ah!
A vida sobretudo — é poesia.
Inconscientes, nós a vivemos, dia a dia
passo a passo — mas em sua intangível
plenitude ela vive e se nos traduz em poesia.
Longe, muito longe da antiga frase
'Faz de tua vida uma obra de arte';
Não somos nós nossa obra de arte."

   Já Amada Imortal, o mundo íntimo de grandes músicos através de 300 cartas amorosas, de Kurt Pahlen. Ele , um estudioso da música. Estou lendo as cartas de Mozart. Uma escrita cotidiana, sem nenhum rebuscamento, fala carinhosamente, de forma singela. Em nada parecendo o gênio musical. E assim seguem outros músicos do séculos XVIII ao XX. 

   Assim vou com sede, virando cada página, descobrindo um pouco dos célebres em seus momentos de intimidade. Dificilmente, hoje em dia, se vai encontrar correspondência de escritor famoso. A tecnologia tornou as cartas objetos literários em extinção. Que pena! 

quarta-feira, 28 de março de 2018

MIRANDO ALVO: VOCÊ

   Os últimos dias foram instigantes quanto ao que empresas digitais conseguem com apenas um clique do usuário da rede. Resultado: dados pessoais compartilhados para quem der melhor preço.

   Quando se pensa que o livro de George Orwell, 1984, virou conto da carochinha, de tão ingênuo para dias atuais, é que se percebe que a tecnologia pode se tornar extrema inimiga do homem quando mal utilizada por aqueles sem escrúpulos, com fim último de moldar pensamento de cada um.

   Através do simples bate-papo na rede, a gente achando ótimo ter contato com amigos distantes no tempo e, agora, presentes no dia a dia das redes sociais, enquanto isso, as experts utilizam processos quantitativos e qualitativos do conteúdo a fim de servir interesses diversos (na maioria, que não são os nossos). Extraem dados estratégicos para uso eleitoral, peneiram itens importantes para uso de mercado, incentivam uso de produto com constante e massiva propaganda, dizem o que você deve dizer —  assustado? É isso mesmo, você faz tudo sem ao menos questionar. Robô nato fabricado para atender a determinada classe social, econômica, política.

   Seres sem autonomia, sem vontade própria, sem liberdade. No que nos transformamos em pleno século XXI. Lembra da educação bancária que recebíamos nos anos da ditadura, está voltando (ou na verdade, sempre esteve na moita). Pior ainda, abarca todas as mídias com assuntos que convêm a tantos interesses que a gente, ingênuo cidadão sem consciência crítica, é fisgado que nem peixe em anzolfacinho, facinho, assim. A tecnologia está como a educação bancária. A gente somente vê o que eles querem a que gente veja. A gente somente consome o que eles decidem que a gente deve consumir, a gente vota em quem eles exigem que a gente vote. A gente é fiscalizada dentro de casa e o Grande Big Brother têm a gente nas mãos. Pessoa a pessoa, individualizada.

   Educação educação educação. Investir na criticidade, no questionamento, não aceitar nada de cara, mas refletir sobre, se é bom e saudável para gente. Pelo menos a experiência está sendo instrutiva para que o usuário se ponha como dono do próprio corpo e mente (isso não é específico para mulheres). E exija das empresas de tecnologia, transparência no uso dos dados pessoais, que afinal de contas, pertence unicamente à própria pessoa. 

   A gente não quer ser produto. A gente é pessoa!   

sexta-feira, 23 de março de 2018

MELHOR DE TUDO!

   O trimestre finda ... daqui oito dias. 2018 a galope e eu não querendo frear. É como percebo a importância do tempo para quem está na idade.

   Acaso morresse hoje, estaria satisfeita. Vivi o que escolhi viver. Vivenciar cada experiência buscando o profundo (apesar de na juventude só enxergar superfície). Viver no limite da percepção do que se considera bom, entremeado de um tanto de indecisão, erro, olhar distorcido (melhorado com auxílio de terapia).

   Fazer terapia. Este é dos poucos conselhos que considero fundamental por conhecimento pessoal e não profissional. Trabalhar questões que afligem durante fase de amadurecimento (adolescente - adulto) faz grande diferença na descoberta da paz interior, do conhecimento de si mesmo, da descoberta dos defeitos e forma de se melhorar como pessoa, na convivência com o outro etc. Se bem que, quando não se quer mudar... atitudes e comportamentos encrustados  vão perfazendo estrada.

   Não é fácil mudança. A resistência é tempero cruel. Faz com que adiemos a busca. Mesmo com nove, quase dez anos de psicoterapia reconheço. Mas, depois, fica super simples viver cada dia: abandono dos bloqueios que interferem na atuação saudável, reconhecimento de erros com facilidade, opção por comportamentos adequados e o MELHOR de tudo, a angústia não fustiga com intensidade.

  Tenho observado que muitos estão à procura de cura fácil, do vapt vupt, do uso da respiração meditativa como condição para o bem total (tem parcela de contribuição, mas não é somente isso), de terapias alternativas que não visam o discurso (tem parcela de contribuição, sim, não resultado duradouro). Enquanto  atira para todos os lados, não encontra paz necessária.

    Então, como disse, não querendo frear, atenta às novidades que sim, pintam por aí, para toda e qualquer idade. Novidades que valem a escolha e que cada uma ou um, saberá qual. Seja bem vindo, segundo trimestre, inicia-se outono.

   Por falar nele, chegou em Floripa. Ar fresco e noite esfriando. Aproveitando o sol que, durante o dia, ainda dá ar da graça e se pode curtir uma praia possível. Até o dia das mães, quando o inverno se apossa de vez.

   Busque o MELHOR de tudo. Diferença na construção.     

segunda-feira, 19 de março de 2018

MARCAS DA VIDA

Quadro de Ju Martins
   "O filme é um soco na boca do estômago." Foi essa afirmação que postei sobre o que introjetei do filme Leviatã, do diretor Andrey Zvyagintsev, http://aposentadativa.blogspot.com.br/2016/01/monstro-que-engole-o-cidadao.html .

   E, agora, de novo, esta frase soa e ecoa o que continuei sentindo após ter assistido outro filme do diretor russo, Sem Amor, de 2017.

   Tantas sensações dolorosas, tantos sentimentos contraditórios.

   Aquele menino de doze anos não mais me largou. Sinto a dor dele ruminando dentro da alma, sem sossego. 

   Meus pensamentos, que depois de velha, parecem insistir permanentemente, entremeando sentimentos e emoções dolorosas, insistem dificultar o estar no mundo. Noites mal dormidas, excesso de questões sem resposta, a conduta de mãe, de pai, como atitudes podem marcar para sempre a criança, significado do desaparecimento, busca, esperança de encontro, continuar persistindo no caminho de vida, a linguagem no convívio familiar, marcas chanceladas nos envolvidos, egoísmo ...

   Fiquei horrorizada com a postura da mãe. Fiquei. Mas como julgar. Quantos não optam viver a própria vida sem prestar atenção aos laços. Apenas seguindo mecanicamente e deixando a vida se entrelaçar aos jogos psicológicos que somos mestres em construir. Assim, brigas de casais tomam características de confronto em que muitos são lesados no processo. O filho costuma sofrer, indefeso. Marcas que perfilam vidas e vidas...

   O imaginário infantil é tão potente que pode aniquilar. No filme, e em muitas realidades, continua sem resposta. Indico para todos, mães, pais, filhos, todos guardamos inscritos passado e linguagem (ainda que nem sempre seja a verdade, mas verdade imaginária é a que conta).

   A muito tempo não me sinto assim por uma peça da sétima arte. Socos e mais socos.