sexta-feira, 14 de novembro de 2014

PRIVILÉGIO DE SER OUTRO

   

   Ave! Finalmente consegui sentar para teclar um pouco. Escrevinhar se tornou uma dificuldade nestes últimos meses. Poderia dar um monte de desculpas: processo de mudança, o tênue inverno que se vai (com ele um certo desânimo advindo da época), o violão me tomando tempo maior de investimento (e eu gostando!), algumas leituras, ...

   Estou com postagens começadas e faltando tempo de burilá-las com cuidado para publicação.

   Eis que no domingo assisti a um filme dos anos 90 e ele não me sai da cabeça. Resolvi priorizá-lo então, algum motivo deve ter. O Harrison Ford está em um papel muito instigante no sentido do significado de existência... pelo menos para mim. O filme é Uma Segunda Chance.

  Seu personagem é um advogado bem sucedido que visa apenas o sucesso acima de qualquer ética. Preocupado com aparência frente a uma sociedade interesseira e financista. Na relação familiar o vínculo com a mulher e a filha beiram ao necessário, num estar superficial e pouco envolvimento afetivo. 

   Eis que sai para comprar cigarros e seu futuro dá uma reviravolta surpreendente. O dono da loja de cigarros está sob ameaça de assalto, e, ele não percebe o que está ocorrendo, insiste em ser atendido. Recebe um tiro na região do ombro; continua insistindo e recebe outro tiro na região da cabeça. Consegue fugir dali naquele estado, caindo ao chão logo à saída.

   A única estratégia possível - sobreviver. Assim ele se encontra por bom tempo. Quando se restabelece, as lembranças se foram, não consegue articular palavras, nem ler, nem caminhar etc.

   Um longo período de recuperação, a área afetada do cérebro vai necessitar de tempo e muito trabalho fisioterápico para que novas sinapses sejam possíveis e ainda uma incógnita de qual alcance de sucesso no restabelecimento de habilidades anteriores.

   Um novo homem vai surgindo a partir das tentativas de se reconhecer pessoa, marido, pai, profissional. E é a sua filha que recorre para reaprender a ler e a convivência emocional traz um  ganho a existência. Uma relação de afeto, de tolerância, de respeito vai, dia a dia, intensificando o papel pai-filha.

   Com a mulher se passa semelhante. Acha que não sabe o que fazem um homem e uma mulher na relação afetiva-sexual. Com o carinho incondicional da esposa transpõe a barreira com sucesso. Retorna ao trabalho, apesar da restrita capacidade intelectual do momento. Vai compreendendo aos poucos através das perguntas que tipo de homem era e não gosta do que descobre.

   Atento a tudo que vem vivenciando descobre que a esposa tinha um caso com um amigo do trabalho; descobre que ele próprio tinha uma amante e que iria pedir o divórcio. No trabalho descobre as suas estratégias para vencer acima de tudo e todos.

   Nesse conhecimento estupefato de uma existência pobre, medíocre, sem significado, rompe com o homem que era. Tem uma segunda chance de viver em família, dar valor ao que realmente merece ganhá-lo, ser uma pessoa integral no amplo sentido do conviver.

   Que privilégio deste homem: esqueceu o tipo que era e pode reconhecer-se um homem melhor a partir de fatalidades da vida.  Segunda chance acho que só em filme mesmo! 

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