segunda-feira, 13 de julho de 2015

EM BUSCA DOS DESEJOS

 
    Este é o meu segundo ano em Floripa e este julho está mais ameno que do ano anterior. Temperaturas agradáveis em torno de 20 graus e quase sempre o sol aparece convertendo o inverno em momentos primaveris, uma delícia.

   Têm dias que junto ao sol sorrisos se abrem, o que é natural, como dizia Fernando Pessoa "... O sol vale mais que todos os poetas e todos os filósofos...". Noutros com ares mais europeus, nuvens densas, vento acirrante que responde às perguntas que nem chegamos a fazer. E assim se vai em contagem regressiva quanto ao frio. 

   Eu aproveitei dia desses e assisti um filme de 2001, na verdade revi, no Badesc, fundação cultural, e nesse dia, ao final, o filme foi analisado sob a ótica da Psicanálise por dois profissionais da área. O filme Balzac e a Costureirinha Chinesa, dirigido por Dai Sijie, produção francesa-chinesa. Longe de mim detalhar a crítica pontuada por aquela teoria. Esqueço o lado profissional e deixo apenas as impressões e emoções fluírem.

   É legal quando se assiste um filme mais de uma vez. Novas conquistas sobre a paisagem, os personagens, o conteúdo, tudo abarcando mais qualidade a nova leitura. E é assim que enfronhei na história, fazendo o trajeto juntamente com os dois principais personagens. A China retratada da época comandada por Mao Tsé-Tung nos anos 70, a realidade do ambiente, da política e da sociedade vista a partir de um povoado.

   Os jovens vão prestar serviços voluntários nesse povoado distante, no Tibete, com a obrigatoriedade de reeducação, pois eram filhos de pais burgueses, dentista e médico, considerados subversivos a época. Assim que chegam percebem pelo linguajar simples da comunidade que as notícias chegam, mas as que convém ao "stablishment". E todo cuidado é pouco na produção das palavras que não devem ser ditas, erros são punidos com castigos severos.

   Nos seus dezoito, desabrochando para a sexualidade, os dois jovens tem convivência com uma costureira de idade aproximada a deles. Laços surgem a partir das poucas horas de folga. O lago é lugar de brincadeiras e o amor floresce. A moda de cada um, vão amar aquela menina, a costureirinha.

   Os jovens trabalham pesado junto com a comunidade, sobem a estrada para chegar ao campo, a estrada é uma grande escadaria que parece não ter fim. E na convivência emanam conhecimentos ocidental e oriental, enriquecendo aos jovens, aos camponeses. A cultura não é difundida, pois é considerada uma forma de criar subversão. Nada de livros, escola, arte. Todos os livros foram queimados. Eles trazem àquele povo a tradução dos filmes que antes eram apenas vistos, sem dublagem. Também, aos poucos, vão contando as histórias da literatura clássica ocidental.   

   Conseguem descobrir uns poucos livros de um dos reeducandos e os escondem para evitar a tragédia da destruição: Balzac, Dostoiévski, Flaubert, Tolstói, Victor Hugo, literatura chinesa traduzida para o inglês, dentre outros. Vão gradativamente destrinchando a literatura e libertando a mulher incrustada na costureirinha, que a partir de então se dá conta de sua natureza feminina, descobre as palavras e deseja mais muito mais que o povoado lhe pode oferecer. Os rapazes descobrem a mulher que vai além, têm sonhos que Balzac semeou e não consegue voltar a ser a costureirinha de antes.

   Vinte anos mais tarde o povoado é invadido pelas águas de uma hidrelétrica, o passado sob as águas. O filme perpassa o ingênuo, caminhando vai burilando personalidades, trazendo a consciência proibida e como consequência o voo para tornar-se sujeito de seu próprio desejo.    

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