segunda-feira, 20 de julho de 2015

FANTASMA PARA SEMPRE

 
   "Um fantasma não chora." A frase norteou as últimas falas da mãe, dada como morta e que reaparece como fantasma para uma comunidade onde a crendice e a loucura permeiam o cotidiano. 

   Antes a mãe tivesse voltado para alegrias. Angústias com acontecidos fazem que ela repense as filhas, uma sofrida mais que outras porque vítima do próprio pai, dá a luz uma criança que é filha e também irmã. 

   A perversão é conhecida, mas não aparece em cenas, o que traz para a tela são as dores de personagens envolvidos por ela. Agora a mãe que tem a filha/irmã sabe por esta que acaba de matar o próprio pai, alcoolizado, por querer sexo com ela, alegando não ser o pai verdadeiro. Essa mulher calejada por ter vivido tal situação age heroicamente em defesa da filha e assume a responsabilidade pelo crime. 

   Sem saber que fazer, limpa toda a cozinha, local do acontecido. Embrulha o corpo em cobertor e o coloca num freezer. O freezer se encontra no restaurante de um amigo que tenciona vender o local mas precisa viajar e confia a mulher, Raimunda, as chaves para mostrar o local aos interessados.

   Vai daí que um grupo que filma perto dali procura um restaurante para servir  comida aos participantes durante as filmagens. Ela aceita a incumbência, tem que sobreviver a sua conta desde a morte do marido, Paco. Tem-se a impressão durante o serviço do restaurante, quando ela serve bolo de carne que algo está estranho, quem conhece a história do barbeiro que matava os clientes e produzia tortas entenderá. Tal não ocorre, ela enterra o corpo a 180 km de onde morava.

   Raimunda é a personagem de Penélope Cruz no filme VOLVER, de Pedro Almodóvar, 2006. Uma mulher fortalecida pelo destino cruel de ser violentada pelo próprio pai e enfrenta a batalha da vida nos cuidados da filha adolescente. Ironicamente, seu companheiro Paco tem a intenção de cometer o mesmo erro, a menina se defende. 

   Paralelo aos seus problemas, existem os da mãe, que supostamente morreu com o marido em incêndio quatro anos antes. Fofocas da vizinhança dão a entender que ela reaparece, conversa com as pessoas. Na realidade ela encontra o marido e a amante, enquanto dormem e põe fogo no local, desaparecendo em seguida, sem saber o que fazer, vai visitar a irmã para se despedir, e ao encontrá-la debilitada, cuida dela até a morte. O mesmo faz com a filha da amante do marido, quatro anos depois, sozinha e com câncer, como forma de compensar o erro cometido.

   O desencadear do filme é belíssimo, como só Almodóvar é capaz. Juntando os fios, tantos, se descobre as diversas faces de "o inimigo que mora ao nosso lado". Raimunda relembra a dor que passou e a raiva que teve da mãe por não ter percebido nada. Essa mãe sofre por ter sido cega com relação ao homem que amava.

   E no retorno a mãe tenta apaziguar dores, tantas, as quais não tinha percebido ao redor e a seu modo procura restaurar laços partidos. E aqueles segredos vão sendo resolvidos por seus participantes sem a necessidade de dar a conhecer a deus e o povo. Lindo filme.    

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