terça-feira, 29 de agosto de 2017

A MENTE COMANDA

Pintura de Sinval Fonseca

   Florence me cativou. Deu uma guinada em sua existência e sobreviveu à terrível sífilis que matava qualquer pessoa em poucos anos. Ela sobreviveu a mais de 50 anos com as consequências, o que admirou o médico que a atendeu.

   Como conseguiu tão longa vida com problemática tão delicada e dolorosa?

   Pois é. Como tinha pouco tempo de vida, conhecia o ritual da tal doença, resolveu que ia viver e fazer o que gostava. Ela adquiriu a doença do primeiro marido, considerado rico e herdou boa soma de dinheiro para sobrevivência. Quando jovem, professora de piano, tinha bom ouvido para os clássicos e discernia coerentemente quando um pianista era bom o suficiente. Assim encontra um que vai contribuir para que ela leve seu sonho adiante.

   Com as mãos paralisadas pela doença, caminha em busca do desejo. Quer cantar. A voz não ajuda, tantos traumas, mas não se arrefece. Vai adiante, com a contribuição do atual marido (mais jovem que ela, mas dependente financeiramente) e o pianista contratado para acompanhar seu desenvolvimento no canto. Treina, treina, treina. A voz não ajuda. Mas ela tem dinheiro.

   Florence não está voltada somente para si, o que acontece ao redor, chama-lhe atenção, por exemplo, quando escuta uma família contando sobre a morte do filho que foi à guerra. Sensível, tem a ideia de alugar o Carnegie Hall, em Nova York, e convidar mais de mil soldados para assistir ao show, ela cantando, forma de lazer para jovens tão estressados.

   Ensaia, ensaia. O pianista vê o fiasco lá na frente, tem medo, afinal, apresentar-se no imenso teatro, famoso, e se tudo der errado, adeus carreira.

   O grande dia acontece. Ela apresenta-se e ao início, a plateia manifesta-se de forma jocosa e divertida, visualizando ali uma comédia. Uma mulher da plateia, que em outra ocasião rira dela em uma apresentação, nesse momento, toma dores da cantora e exige respeito durante apresentação. Acontece!

   Para Florence, agora importa as críticas de conhecidos jornais. E o marido corre atrás das notícias a procura de críticas positivas. O New York Times solta crítica que destrói a cantora. O marido compra todos os jornais do NY, de todas as bancas de revistas próximas de casa. E joga no lixo. Retorna a casa e ela feliz com as notas, e percebendo a falta do jornal do New York. Ele diz que não encontrou, pois todos foram vendidos.

   O marido atual, é suis generis. Devotado aos desejos da esposa. Ele tem vida confortável e retribui o tratamento. Cuida dela com carinho, não deixa que nada a chateie, apenas o que agrada a ela é levado em consideração. Sempre atento ao seu rosto, se há desconforto, ele está ali para retirá-lo de perto dela. Ele e a esposa não têm relações sexuais, já que a doença é contagiosa, são os carinhos correspondidos e afeto do cotidiano, uma relação feita há muitos anos, que estão presentes. Ele, numa situação, defende a esposa, quando riem da apresentação do dia anterior numa mesa de bar. Revolta-se e vai tirar satisfação. Ele ama a esposa, é leal a ela, isso cativa.

   Pois é. Eis o filme FLORENCE, com a atriz Meryl Streep no papel e o ator Hugh Grant, que me surpreendeu com sua atuação convincente. Vale a pena assistir. Muito inspirador. Por quê?

   Ao final, Florence sai a cata do New York e acaba lendo a desastrosa crítica sobre sua apresentação. Isso a abala. Volta para casa sentindo-se debilitada. O marido a ampara ao chão e ela diz... " posso não ter cantado bem, mas cantei no Carnegie Hall...". Isso, por si só, basta! 

   O que é a busca por algo que inspira. Inspira desejo, move para ação, realiza, o cérebro comanda, os sentimentos convergem, uma simbiose de elementos a favor, já que a mente é poderosa, e a reação. Pode curar!

   Assim concluí ao final do filme. Florence, muito inteligente, cercou-se de pessoas devotadas. Soube conduzir o processo com esperteza e cuidado, conhecia suas limitações e dos que a serviam. Viveu a vida que desejou. O caso vem de história verídica.

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