quinta-feira, 9 de julho de 2020

intimidades (CENA 20)

06/07/2020

            Osvaldo e Luiza saborearam a delícia junina em silêncio. Depois colocaram as máscaras.

― E pensar, Valdo, que as coisas lá fora estão tão terríveis, mais de cinquenta e sete mil mortes até ontem, vinte oito de junho, que horror! Já pensou se contabilizado o real?

― Dizem que se pode multiplicar por dez, outros dizem cinco. O número é assustador. Incrível é Taiwan com quatrocentos e quarenta casos e sete mortes. Eles ficaram dois meses sem casos. Lá houve ação rápida e efetiva do governo e população colaborou, além de terem estrutura organizada. Enquanto aqui...

― Continua a desinformação. ― Luiza completou.

            Osvaldo foi à cozinha e trouxe dois copos com bebida quente. Levou à mesa e o aroma fez que fugissem por instantes.

― Até quentão! Cozinheiro de mão cheia, hum, que delícia esse cheiro de gengibre! Não posso beber muito, tenho de ir pra casa.

― Fiz pé de moleque também, sobremesa. O quentão está fraquinho, usei cachaça de Minas, afinal, festa junina sem estilo mineiro não tem graça, uai. Mas agora te confesso que a vontade mesmo é de pitar. Vamos pra varanda? Fico num cantinho e você mais próxima à porta, leva seu copo.

A cadeira confortável, a bebida, o encontro.

― Que delícia de canto, Valdo, você tem razão de gostar daqui, que paisagem! Essa mata aqui detrás faz a gente querer ficar quietinha e esquecer as agruras. No meu, vejo só aridez do concreto.

― Posso fumar descansado. Não fumo lá dentro, coloquei essa regra e cumpro. Na verdade, deveria mesmo é cortar esse maldito, sou fraco e descuidado comigo. Fico aqui conversando com ele, imaginando às vezes a presença doce de minha mãe e de meu irmão. Sinto falta deles.

― Valdo, você não é de falar sobre sua vida, né, entendo, tem tanta coisa que fica cravada na garganta.

― Senti algo quando toquei sobre casamento. Você ficou pensativa. Já se casou alguma vez?

― Vim pra cá em busca de paz, Valdo. Tentei esquecer a história do meu passado, mas ela me persegue aonde vou.

― Oh Luiza, desculpa meu atrevimento.

― Pra você não tenho receio de falar da minha experiência. Tudo que quiser perguntar pode falar sem medo de me magoar. Esses dias ando muito emotiva, muitas coisas me entristecem com a situação que vivemos. Fico triste com filme, música... Mas vai passar. Eu vou melhorar e quem sabe te falo talvez numa próxima vez. Vai ser bom desabafar. É bom ter um amigo tão longe de casa.

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