quarta-feira, 16 de setembro de 2020

carta amiga (CENA 27)

 

11/09/2020

            Querida Leila

         Ando pensando muito nossas vivências adolescentes. E como adolescente quero escrever, esperando encontrar você bem. Sabemos todos que nossa finalidade quase única hoje é a de estar bem, tendo em vista nossa realidade assustadoramente inacreditável. Pois é, quem diria que um vírus dessa proporção iria, ainda mais, nos mostrar o quão ínfimos somos, iria esmagar nossa insignificância. O mundo está de molho, os que podem ficam em casa, a movimentação escasseou, e com isso a natureza (a que o homem não atinge com incêndios propositais) resplandece a olhos vistos. A natureza pede respeito, e quando não escutada responde com catástrofes. Mas a sociedade parece não se emendar.  Todos estamos chocados com decisões descabidas, não vemos atitudes dignas de governantes no mundo. Como esses atores políticos desta época são de uma pobreza, hein, Leila! Aqueles nossos áureos tempos de ativismo e idealismo, em que havia os que realmente pensavam a Nação e seus cidadãos. Os de hoje enxergam cifrões. Chega, interrompo aqui esse assunto áspero, cru, espinhoso, isento de coração, chega de falar disso, não é? afinal o poder de modificar a história está nas nossas mãos. Transformação possível é com povo consciente de seu papel na luta por mudança. Concorda?

         Vamos lá, deixemos o lado adolescente aflorar por pequenos momentos. Lembra nossos encontros com a turma, nossos sonhos e desejos querendo arrebatar todo nosso corpo e nos mostrando o caminho da emoção e sentimento? Ah, tempo bom e difícil, tantos complexos carregávamos e que ainda hoje se escondem nos vãos dentro de nós. Vocês, mulheres, ainda mais que nós homens devido repressões familiares da época. Tenho saudade dos nossos papos sem intenção, o olhar ao outro em aconchego. Você, que com carinho e sensibilidade, dava vazão à entrega e escuta cuidadosas do que feria a gente no mais fundo. Sua atitude para comigo era apaixonante porque meus sentimentos eram tão contraditórios, e muitos ainda o são, mas você me instava ao movimento, a não me acomodar àquelas dores que eu parecia sentir gozo em ter, o lado masoquista do meu jeito tristonho, como ouso dizer a mim. Não ria, por favor, hoje admito sem a vergonha que me amedrontava.

         Segue  um poema:

perder a inocência

como é triste

perceber

que nunca mais

será azul e puro

como mar e céu

música com

outra entonação

as misérias do mundo

os inocentes sempre pagam

pelos pecadores

falar da vida

tantas implicações

quisera eu

continuar criança

 

        Muitos temas a discutir, não é?

        O que pensa você do Brasil de hoje?

Envio carta a todos com essa mesma proposta, a de nos encontrarmos naquela mesma data de sempre dos tempos juvenis, e no mesmo local. Espero que até lá o corona deixe de ser bicho papão.

Abraço forte e fraterno do Osvaldo

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