11/09/2020
Querida Leila
Ando pensando muito nossas vivências
adolescentes. E como adolescente quero escrever, esperando encontrar você bem.
Sabemos todos que nossa finalidade quase única hoje é a de estar bem, tendo em
vista nossa realidade assustadoramente inacreditável. Pois é, quem diria que um
vírus dessa proporção iria, ainda mais, nos mostrar o quão ínfimos somos, iria
esmagar nossa insignificância. O mundo está de molho, os que podem ficam em
casa, a movimentação escasseou, e com isso a natureza (a que o homem não atinge
com incêndios propositais) resplandece a olhos vistos. A natureza pede respeito,
e quando não escutada responde com catástrofes. Mas a sociedade parece não se
emendar. Todos estamos chocados com
decisões descabidas, não vemos atitudes dignas de governantes no mundo. Como esses
atores políticos desta época são de uma pobreza, hein, Leila! Aqueles nossos
áureos tempos de ativismo e idealismo, em que havia os que realmente pensavam a Nação e seus cidadãos. Os de hoje enxergam cifrões. Chega, interrompo aqui esse
assunto áspero, cru, espinhoso, isento de coração, chega de falar disso, não é?
afinal o poder de modificar a história está nas nossas mãos. Transformação
possível é com povo consciente de seu papel na luta por mudança. Concorda?
Vamos lá, deixemos o lado adolescente
aflorar por pequenos momentos. Lembra nossos encontros com a turma, nossos
sonhos e desejos querendo arrebatar todo nosso corpo e nos mostrando o caminho
da emoção e sentimento? Ah, tempo bom e difícil, tantos complexos carregávamos
e que ainda hoje se escondem nos vãos dentro de nós. Vocês, mulheres, ainda
mais que nós homens devido repressões familiares da época. Tenho saudade dos
nossos papos sem intenção, o olhar ao outro em aconchego. Você, que com carinho
e sensibilidade, dava vazão à entrega e escuta cuidadosas do que feria a gente
no mais fundo. Sua atitude para comigo era apaixonante porque meus sentimentos eram
tão contraditórios, e muitos ainda o são, mas você me instava ao movimento, a
não me acomodar àquelas dores que eu parecia sentir gozo em ter, o lado
masoquista do meu jeito tristonho, como ouso dizer a mim. Não ria, por favor,
hoje admito sem a vergonha que me amedrontava.
Segue um poema:
perder a inocência
como é triste
perceber
que nunca mais
será azul e puro
como mar e céu
música com
outra entonação
as misérias do mundo
os inocentes sempre pagam
pelos pecadores
falar da vida
tantas implicações
quisera eu
continuar criança
Muitos temas a discutir, não é?
O que pensa você do Brasil de hoje?
Envio
carta a todos com essa mesma proposta, a de nos encontrarmos naquela mesma data
de sempre dos tempos juvenis, e no mesmo local. Espero que até lá o corona
deixe de ser bicho papão.
Abraço
forte e fraterno do Osvaldo
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