sábado, 23 de julho de 2016

A ESPERANÇA DE DICKENS

   No domingo assisti o filme Mr Pip, de 2012, com aquele ator de House, Hugh Laurie. O filme vem recheado de aventuras por um lado e de outro, a terrível agressividade e carnificina oriundas de uma guerra, onde são massacrados em sua existência o povo de Papua Nova Guiné, na sua maioria crianças, mulheres e velhos, já que os homens e os jovens são levados obrigatoriamente a servir o exército na guerra.

  A população é castrada em seus direitos. Não tem um povoado estruturado, com escola, hospital, praças, empregos. Tudo é subsistência. A sobrevivência consiste em não incomodar o ditador da guerrilha. O silêncio e o esquecimento de atos de vandalismo e crueldade é obrigatório, senão o golpe fatal é a perda da vida.

   Assim vão vivendo as pessoas daquela comunidade. Até que um dos moradores, único de raça diferente dos locais, um branco, casado com uma das moradoras, chamado por todos de Senhor Pip, resolve dar aulas para a garotada. A mulher dele tem problema mental e geralmente fica em silêncio. Ele cuida dela com afeto e carinho irreconhecíveis.

   No início da classe ele revela não ter habilidade de professor, mas se dispõe a encantar a vida daquelas crianças a partir da história de Charles Dickens, Grandes Esperanças (no português), onde existe um tal de Mr Pip.  Em contrapartida as mulheres do local querem também participar como professoras levando as histórias locais. No que são respeitadas pelo professor. Elas consideram os ensinamentos do livro com abordagem que traz ideias para além das exigências no povoado. 

   E a criançada atenta às palavras do professor, cada qual ao seu modo vai construindo o arcabouço interior pelas mensagens de fé e esperança que trazem o livro. A mais envolvida de todas é uma mocinha, que a partir de cada etapa, vai vivendo sequencialmente as cenas em sua fértil e inteligente imaginação. A mocinha escreve o nome Pip na areia da praia e ao mesmo tempo vive cenas do livro. 

   No decorrer o professor cria uma afeição pela mocinha devido às conversas que têm sobre o livro. Propõe tirá-la daquele lugar junto com a mãe num barco que sai durante a noite e que avisaria quando. O que acontece a seguir vai modificar a intenção. O ditador volta ao local e quer saber o que é Pip, pois viu o escrito de cima, de um helicóptero. Contam que é um personagem de um livro. Ele quer ver o livro e a mocinha corre até a escola para pegar, pois ficou sobre a mesa. Chega lá e não o encontra. A mãe dela escondeu o livro para que as aulas fossem interrompidas e naquela situação acabou ficando calada por não poder revelar o que fez. O ditador diz que vai dar um prazo para mostrarem quem é o tal Pip. Isso já queimando móveis e utensílios de todas as casas do povoado. Até a escrivaninha da mocinha, onde ela escondeu o livro achado nas coisas da mãe. E a única salvação queima na fogueira.

   Como não tem como comprovar a existência do Mr Pip, o professor vem com um nariz de palhaço, vermelho e, diz ser o senhor Pip, o que é confirmado por uma das crianças. O ditador acha que está sendo enganado, não acredita em nada. Mata o professor, a criança e a mãe da criança, a mãe da mocinha que também se atreveu a falar. Quando vão embora deixam o povoado atirado ao caos, próprio das guerras civis que tanto vemos pelo mundo.

   A mocinha perdida vai para a beira da água e de repente vê o nariz de palhaço pendurado num galho. Entra na água e força o corpo até conseguir pegar, mas não consegue e acaba se afundando e a correnteza levando, até que é salva pelo Mr Pip de Dickens. Na verdade um grupo que estava fugindo do local no barco e percebe que ela está se afogando. São resgatados mais tarde por um navio e ela vai para a casa do pai, na Austrália, lugar que a mãe resistiu ir, com dificuldade em largar a cidade natal.

   A mocinha visita Londres e conhece a casa onde Dickens viveu e que é um museu. Também descobre que o professor era casado com outra mulher na verdade e deixou-a por uma atriz da época, que era do povoado onde ela vivia. A ex-esposa do professor alega nunca ter entendido o que ele viu na tal atriz e que tinha sido um homem que nunca conseguiu nada na vida. Bem ao contrário do homem sensível e intenso que a mocinha conheceu. Descobre o livro na biblioteca dele e a ex-esposa lhe dá de presente.

   Os ensinamentos e experiências da mocinha mais tarde vão orientar a vida da mulher que se tornou Matilda. O nome é a única coisa que possuímos e que ninguém pode nos tirar. E a importância de correr atrás dos sonhos. Torna-se uma professora e num novo tempo ensina as crianças do povoado.

   A esperança dá significado à existência.    

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