A
PRIMAVERA COMPENSA
09/10/2017
Colocou os pés sobre a areia da Ilha de Santa Cruz e a suavidade da água
fez que acordasse do cansaço da viagem que
durou
cinquenta dias. A mão forte do sujeito mal encarado lhe apertou o pulso jogando-a
no
cercado onde estavam outros recolhidos para a fazenda do Visconde
Primavel.
No
outro dia, conduzida à
roça com escravas antigas que depositavam
sementes sob olhar
do
responsável
de
prontidão ao
que se negasse a trabalhar. Com
trejeito, coçava couro cabeludo, vinha-lhe caroço a mão, enterrava na terra.
Sementes
presas
aos
cabelos, lembrança da mãe África.
Chuvas vieram.
Aos
primeiros meses do ano seguinte farta colheita de
feijão pôde
abrandar dor da pátria. Através do paladar, o guisado acompanhado da carne desprezada pela
casa grande e ao
ritmo de
danças e cantos africanos.
Sons
ecoavam nas
noites e a senzala em festa agradecendo a fartura através
de
batuque.
Os fazendeiros ouviam
sussurros
tristes embalando canções e comentavam,
como
pode, esse povo
feito
para o trabalho suado e mandado obediente, ainda entoar
canções?
O
grito da alma fora da casa grande.
Ana dançava na
roda. Comemorava o milagre da semeadura
na primavera e agora, a
colheita que alimentará seu
povo esperançoso de melhores ventos. A gamela, no tamborete ao canto, recheada de flores, amor-perfeito e
violeta, servia de iguarias
comestíveis
lançadas
à boca, suavizando marcas.
O
aroma rescendia a canela,
cravo e perfumes da floresta nativa.
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