sábado, 10 de maio de 2014

EM MAIO... NUMA PRIMAVERA COM HEINE!

   

   Li Heinrich Heine, Viagem ao Harz e adorei a forma como ele poetiza seu relato de viagem, como escrevi em postagem anterior. Não quero guardar o livro, não sem antes deixar um trecho, pág. 113 a 115:


"Hoje é primeiro de maio. A primavera derrama sobre a terra seu mar de vida, a escuma branca das florescências pende das árvores e uma névoa espalha sua claridade ancha e quente por toda parte. Na cidade, as vidraças de cada casa reluzem alegremente, os pardais reconstroem seus ninhos sobre os telhados, as pessoas passeiam pelas ruas e admiram-se de que o ar esteja tão cheio de vida e, eles mesmos, tão cheios de disposição; ..."

   Ele escreveu em 1824, o livro foi publicado em 1826. Viagem a maior cadeia montanhosa do norte da Alemanha, e o legendário Brocken, pico mais elevado, onde misteriosamente as bruxas celebram a Noite de Valpúrgis, cantada por Goethe no Fausto. Com maestria poética, o escritor faz com que eu esteja junto a ele, aqui em pleno século XXI, em pleno outono, ouvindo as canções que ele se põe a fazer para três rios de nomes femininos: Ilse, Bode e Selke...

"É primeiro de maio e penso em ti, minha bela Ilse - ou devo chamar-te Agnes, por preferires esse nome? - , penso em ti e queria vê-la mais uma vez, descendo esplendidamente a montanha. Ou melhor, queria esperar por ti lá embaixo no vale e receber-te toda em meus braços. Que belo dia! Vejo o verde em toda a parte, cor de esperança. Florescem flores em toda parte, como um prodígio fagueiro. E também meu coração quer florescer, coração que também é flor, flor bastante prodigiosa. Não é violeta das mais modestas, nem a rosa mais risonha, nem dos lírios o mais puro; tampouco flor das mais comuns, daquelas que, com sua gentileza bem comportada, alegram o coração feminino, deixam-se espetar belamente sobre os belos seios, fenecem hoje, mas amanhã florescem novamente. Este coração, aqui, mais se assemelha àquela flor grande e fabulosa das florestas do Brasil, que, segundo reza a lenda, floresce somente uma vez a cada cem anos... Mas se esse amor elevado for alto demais para ti, menina, sinta-se à vontade para subir a escada de madeira e, lá de cima, espiar o interior de meu coração em flor.

Ainda é cedo, o sol mal percorreu metade de seu caminho e meu coração já exala um perfume tão forte, que me sinto atordoado, que não sei mais onde acaba a ironia e começa o céu, que povoo o ar com meus suspiros e quero desfazer-me novamente em doces átomos, na deidade incriada - mas o que acontecerá então, quando anoitecer e as estrelas surgirem no céu, "as estrelas desditosas, que poderão te dizer...".

É primeiro de maio. Hoje até o mais miserável dos pilantras tem direito de ficar sentimental - e você quer privar o poeta desse direito?"

   O escritor sofreu muito nos últimos oito anos de sua vida, consumido por uma paralisia que lhe tirou a saúde das pernas, permanecendo acamado. Contam que se deveu a chumbo em seu corpo. Longe dos tempos de glória da juventude, da saúde, do dinheiro... tudo isso passou com o advindo da doença... até mesmo a falta de amigos à sua cabeceira. O que fica é a sua poética visão da vida, que continua colorindo a graça dos dias, como se vê no trecho acima.

   Li esse trecho final do livro no dia primeiro de maio e acabei não tendo tempo para postar. Não aceito desistir de fazê-lo, tão belo me soou, qual uma Ilse... Ai! Quem dera um poeta me encantasse com tal palavreado. Mesmo outonal, despertei em pétalas!    

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